Geração Cosmogônica em Folha e Pau

Estamos diante de um livro de poesias que resgata, de certa forma abrangente a mais, tudo que foi referenciado no compêndio de poesias dito O Pindura-saia e as monções de um tempo Branco. Esse título alberga memórias inconfundíveis da região do Alto Paranaíba. Então, o livro todo é um hino amoroso a tal região, o que confabula com todas as viagens que o poeta fez em torno e ao longo desse mundo espectral. Lugares emancipados pela beleza, por uma natureza cheia de confrontos com serras e lagoas, com rochas e grandezas de pássaros multicoloridos. São livros quase memoriais, acaso não fosse esse trabalho todo cinzelado que o estilo de J Humberto Henriques propõe sobre e dentro da palavra.
Quando fala de dona Mariquinha, matriarca do Brejo Bonito, figura emblemática do século passado, o autor provoca a constância dessa memória. Segundo ele mesmo informa, dona Mariquinha, nas alturas de sua idade centenária e sua beleza arquetípica, era personagem da mais alta estirpe. Moradora nos arredores do lugar do Brejo Bonito, dona Mariquinha entra para a história como parte de uma poesia fenomenal. Ao lado de Benedito Grama e outras criaturas de igual teor, dona Mariquinha trafega nesses compêndios com a mesma condição fagueira de personagens bem escolhidos. Na verdade, escolhidos a dedo. No meio desse mundo de situações domésticas e sociais, as palavras vão compondo a grandeza do texto poético, uma poesia condensada e recheada de louvores e sustos gramaticais.
Em seguida, a série de páginas que dá título ao livro, Geração Cosmogônica em Folha e Pau, mostra a figura de dona Zulmira Machado. Fica bastante claro que a memória nesse compêndio de poesias aproxima J Humberto Henriques de Brejo Bonito e de Cruzeiro da Fortaleza mais uma vez, tudo gerenciado por estas coroações póstumas de personagens que um dia deram lugar a um mundo muito particular. Aqui, o mundo ibérico resplandece com a força das grandes penínsulas. E ao longo desse discurso aparentemente prosaico – ledo engano de quem crê em prosaísmo nessa obra poética – aparece a Poesia decantada ao seu grau mais esplendoroso. Seja dona Mariquinha ou dona Zulmira, esse leste e oeste de um mundo esculpido nas faldas do Brejo Bonito, tudo congemina para dar lugar a uma criação sem par em todas as reservas da Literatura Universal. O autor se consagra.
Depois, buscando um giro de certa latitude determinada, J Humberto Henriques faz menção a Pedro Machado. E a Henrique Machado. Trata-se de um único cadinho que alberga todos aqueles que um dia exerceram sobre a vida do poeta esta fascinação exótica. E a palavra fascinação aqui é empregada com todos os seus motes. Sabido é que se não fosse pelo caso de haver esse fascínio, jamais um poeta dessa peso e monta arcaria com esta responsabilidade, a de trazer as Letras tudo aquilo que um dia passaria a ser chamado de Geração Cosmogônica em Folha e Pau, um contrassenso logo surgindo no título e determinando todo aquele silêncio que sempre norteou as buscas e as atitudes do autor. Esta cosmogonia que acaba se aliterando e chegando ao confronto com o mais simples que há nesse mundo, a folha e o pau, tudo num estado primitivo de contemplação. O primitivismo dentro da obra poética, usado muitas vezes para suprir certas exigências metafóricas.
Esse passeio por fases domésticas de uma civilização ibérica dá a noção mais fiel das relações que o poeta teve com a própria existência. Entretanto, esse não é um livro de memória – deve-se repetir e enfatizar esse fato. Trata-se de um compêndio apurado de criação poética. A poesia aqui anda livre e solta, detém as qualidades e o estilo que sempre nortearam uma criação espontânea e bem ajaezada. A síntese é a armação mais firme e decidida desse fenômeno de criação estética. O autor trabalha com a metáfora de uma maneira muito decidida. E utiliza outras figuras de linguagem e de estilo, transforma e reforma muitos de seus objetivos iniciais. É um livro programado para fazer parte de um complexo de pesquisa e