Zé Teles e as Estripulias

Zé Teles e as Estripulias
Esse livro condensa os contos mais imponentes que JH Henriques escreveu. Todos - ou quase todos – foram premiados em festivais de Literatura cujo júri era formado por professores universitários de casta sem jaça. Belíssimo livro de contos. Esse compêndio pode chegar a comover mesmo os que não são grandes adeptos da Literatura como um jargão de Estética. Fragmento do Livro: Irany fazia história com espelho limpo, comentava-se.
Divininha, miudazinha de corpo, quase que alcançando o nível dos seios da outra, da Lóla, os braços finisquinhos, capazes de forjar em idéia de ir à quebradura com um simples forçado de polegares sobre eles. Divininha precisava daquele desempenho em sua vida. Precisava de um emprego. Tinha que tratar de sobreviver. Agora, dona de suas responsabilidades frente ao mundo, precisava de se fazer dona de seus narizes. Tão logo ouviu que a palavra governanta é que faria atribuições de seu cargo, ficou com uma orelha brusca de interesse naquilo tudo. Lóla falava a palavra com grandes bocas. Usava a palavra Governanta com jeito de muita alguma nobreza. Era a primeira vez em sua vida que Divininha se deparava com aquela palavra cheia de magnetismo e ressonâncias. Ela que procurava um trabalho de estar doméstica em alguma residência, de repente ouvia da boca de Lóla, uma que estava na casa da Irany, o sobrecargo de ser uma governanta. Achou responsabilidade no desempenho adivinhando do cargo. A própria Irany que nos fins da vida dera para ler Zola, que herdara e resguardara hábitos antigos para com seus clientes, exigia que se dissesse a palavra que ela julgava pressupor alguma aristocracia. Pois que se os tempos se degringolaram, perderam em respeito e dignidade para ganhar em luxúria e leviandade, de sua parte, ela conservaria sempre os princípios que regiam a sua vida, desde que ela se conhecia como patrona de uma bela casa. Não tirara e conservara seu nome do nada. Em qualquer lugar que se falasse a casa da Irany, vinha à tona, em breve minuto, senão o luxo, pelo menos o profissionalismo de suas mucamas. O bom gosto pelas cores fortes, a escolha distinta de cada uma das mulheres que havia de estar sempre limpa na hora da serventia. Irany, durante mais de trinta anos, mantivera todo o resplendor de uma época. Quando alguém falava diante dela a palavra casa de tolerância, em referência ao seu solar, somente assim a velha dama perdia a compostura e falava diante de qualquer um, seja padre ou senador, dizia vá à puta que o pariu!
Tinha sinceridade na língua solta. Pipa nos ares, de cor vermelha.