Joaquina Seca Pau

Esse livro conta uma história que poderia ser chamada de neo-existencialista. Essa Joaquina é personagem de identidade fortíssima, vivente em São Luís do Maranhão. É a primeira vez que JH Henriques conta uma história acontecida de forma fictícia no maravilhoso estado. À sua moda, a narrativa prima pelo trabalho esmerado sobre a palavra. Isso demonstra a ascese poética do escritor. Henriques inicialmente fazia somente poesias. Mais tarde, tomando a identidade de romancista à unha, acabou escrever até sete romances volumosos num único ano. Apesar de parecer conta de mentiroso esse 7, isso é a pura verdade. Fragmento do romance: Uma mulher de corpo fino caminhava com certa pressa entre a Rua do Veado e a Rua dos Prazeres, em sentido perpendicular a ambas, trazia nos braços uma muda de hortênsia e um saco com seis pães franceses. Parecia dona de pressa e o jogo de seu corpo, sendo meio pendido para uma banda, sem definição de lado, dava a impressão da marcha dos velhos negros de São Luís do Maranhão. Era a Joaquina Beça, conhecida demais por ali, em torno de seu lugar de moradia como a Seca-Pau, um apelido que vinha desde os tempos em que fazia as suas travessias em busca de outros mundos, quando adolesceu e criou gavinhas de mulher. Seca-Pau, sendo o nome danado de complicado por conta das aliterações que dele nasciam, à jusante e à montante, de tal sorte que os mais ingratos e tenebrosos em suas maldades podiam dizer que o significado podia ir além da simples verificação do pau, já que pau é matéria que cabe em muitos compêndios e dicionários e cada um leva o seu sentido ao extremo da suspicácia e da questão. Porém, de tanto se dizer que ela era a Seca Pau, o ornamento e o zelo entre o nome e a sua figura até que se tornaram um estado muito bem aplicado, uma coisa combinava com a outra. Era daquelas mulheres cuja figura pode ser identificada a longa distância, de tal maneira que dava mesmo para se dizer o nome dela antes que a imagem pudesse ser ratificada. Numa fotografia que se move, o tempo dela era antes, era de vésperas.
Seca Pau morava no beco entre a rua dos Prazeres e a do Veado, um dente de terra que sobrou desde os tempos de sô Lotário, um homem que tinha por ali uma concentração grande de casas e de barracos de toda natureza. Com o tempo as habitações adquiriram status de cortiço e sô Lotário adoeceu de vez, caiu na cama, afetado demais por um inchaço que subiu das pernas e lhe apanhou o escroto, de tal sorte que aquilo devia mesmo ser uma gelatina que não cabia num saco de sal, daqueles suficientes para trinta quilos de peso. Sempre que passava por ali, mesmo tendo o tempo passado e chegasse ela aos cinquenta, portanto, sobre sua cacunda e naqueles dias havia nada mais e nada menos do que trinta anos de ocorrências. Ela, dizia a si mesma, continuava a mesma e não seria por causa de fuxicos que se deixaria afetar em sua integridade de mulher arrojada. Dava de ombros quando alguém dizia que ela isso, que ela era aquilo. Não estava nem um pouco se lixando para esse tipo de língua quente. Como era mesmo o caso de Prudenciana. Prudenciana era gente boa, amável algumas vezes, em outras vezes era ríspida, porém, gostava demais de estar achando defeito nos outros, sem olhar de fato para a banda do próprio umbigo, como se fosse desprovida de defeitos. A Prudenciana.